Sonhos de luz
Um dia, dei por mim às escuras. Não me lembro se
estava assim há muito tempo, mas só reparei naquela altura. Pensei um pouco no
que fazer. Devia ter guardado a lanterna que me tinham dado uns tempos antes,
pensei, apesar de gostar do conforto de não ver o que me espera. Sem fazer por
isso, tropecei no que parecia ser um candeeiro. Decidi não pensar muito e
experimentei acendê-lo.
Nesse dia, comecei a andar, porque me parecia que
agora que tudo via, mais ainda queria ver, e esqueci-me de apagar a luz
(esqueci-me que os meus olhos também sabem ver sem ela); quando me lembrei, já
tinha perdido o caminho de volta. [Quem me dera que a apagasses por mim.]
Finalmente dei a volta ao mundo inteiro e voltei ao
mesmo sítio. E bem que demorou... o único problema é que agora já não havia
interruptor, só um candeeiro a dar luz sem permissão nem vontade e eu não tinha
forma de o desligar. Exausta, decidi sentar-me ao lado dele, para ver se me
aquecia, já que tudo de repente tinha ficado tão frio. Cansei-me de ali estar, sem ninguém me pedir nem por
vontade própria, e falei com o candeeiro uma vez ou outra, como quem falava
contigo. [Não devias já ter chegado para o desligar?] Eventualmente, forcei-me a concluir que
talvez também estejas a tentar apagar outros candeeiros, ou sem
rumo, no escuro.
Deixei-me dormir e sonhei com luz, novamente. Só
queria um pouco de escuridão.
Sentou-se o Sol a meu lado e perguntou “Ainda te lembras quando a minha luz tanto
te ofuscou?” E eu lembrei-me. Percebi que já não pensava no Sol há muito
tempo, achava que era uma vitória para mim, mas afinal não... afinal até o Sol
deve ser pensado.
E então sentou-se a Lua, sem me dar tempo de reagir e por muito que eu tenha
desejado que ela não se sentasse... e com ela trouxe as Estrelas, os pedaços
dela própria que foi deixando pelo caminho, como simples pistas para eu a
encontrar. Nunca gostei muito disso, porque foram a minha companhia por mais
tempo que eu queria e já me tinha finalmente esquecido do que é procurar a Lua.
Ousou perguntar “Ainda te lembras...?”
antes de se aperceber que era uma pergunta estúpida. Nem a olhei de frente.
Ali ficámos, eu de olhos no chão e eles de luz posta
em mim. [Escuridão, por favor ,escuridão...]
Foi então que pensei: onde está o candeeiro? Com tanta
luz, não conseguia sequer levantar a cabeça, era impossível saber dele. Sorri e
fechei os olhos por uns segundos, para desfrutar da escuridão [e que bem que
soube... que bom é esquecer!]. Quando os abri, estava sozinha, à luz do
candeeiro. Comecei a procurar o interruptor, de mão dada com a escuridão
improvisada, e encontrei-o lá em cima, muito além do meu alcance e poder.
[Quando vieres, ajudas-me a chegar lá?]
[Quando vieres, ajudas-me a chegar lá?]
Mais um texto nada óbvio, mas absolutamente delicioso.
ResponderEliminarMais um “Ela está a falar de quê?”
Acho que sei….
Adoro como escreves.