Foste tu

Um dia, no café das almas, conheci-te pelo nome e olhei-te, sem prestar atenção. Sem fazer por isso, continuei a ver-te por lá e a reconhecer cada vez mais os trejeitos da tua alma dançante. Comecei a sonhar com a tua luz, que deixava a minha alma inquieta. Percebi que crescia em mim uma vontade de te fazer sorrir. Que faço eu com isto?

Noutro dia, contei-te e disseste-me que a tua alma sorriu. Desde então, de almas entrelaçadas, começámos a construir, sem ter de pensar muito. Só por isso, era bonito. Éramos bonitos assim, pintados ao natural, e fomos bonitos a tocar outras almas e a criar almas feitas de nós, para um dia voarem sozinhas. Os sorrisos mudaram, mas sempre houve alguma coisa que foi ficando.

Não acredito em almas gémeas; nunca acreditei. Parece-me insensato pensar que uma pessoa só tem direito a um grande amor, ainda que assim o pareça. Nunca fez sentido, na minha cabeça, mas sei que desde aquele dia que acreditava que as nossas eram feitas uma para a outra, o que me assustava profundamente. E se a vida se intrometesse entre nós?

Inevitavelmente, essa noite chegou e fez-me perceber que, afinal, as nossas almas já não tinham luz juntas, não sorriam com o mesmo brilho. Disse-te, na altura, que a minha chorava... ainda hoje tem os olhos vermelhos. Decidimos seguir o que a vida nos dizia para fazer e deixámos o Espaço tomar as rédeas do tempo, até nos esquecermos que o fizemos.

Passam os anos e não sei nada de ti, nem tu de mim. Admito que não faço por saber... mas porque faria?

Continuo sem acreditar em almas gémeas, talvez mais por esperança do que por convicção, mas sei que as nossas foram qualquer coisa especial. Mal sabemos nós que elas nunca se largaram... parece que quando conheces a alma de alguém, elas continuam a conhecer-se e a crescer juntas, entrançadas, mesmo que os corpos se separem... mesmo que os corpos não o saibam. 

Quem o sabe são as pequenas almas feitas de nós, que já voam...